Para quem escolheu amamentar: liberdade. Para quem torna isso difícil: tratamento. (GUEST POST)

Depois da polêmica fala do psicanalista Francisco Daudt no programa Encontros com Fátima Bernardes, percebi que longe de ter vencido esse preconceito, o Brasil parece caminhar para trás quando se trata da amamentação em público: o que antes era natural e inevitável, parece estar se tornando tabu, com o seio feminino ganhando, cada vez mais, uma conotação puramente sexual. Parece que até para coisas ruins estamos emulando os EUA… tsc tsc tsc.

Aproveitando a Semana Mundial do Aleitamento Materno 2014, resolvi então compartilhar com vocês o texto de outra psicanalista, essa sim empenhada em defender uma visão menos machista e mais pró-mãe do que o nosso amigo Francisco Daudt. Para ilustrar, algumas imagens contundentes. Aproveitem!

Mesmo quando praticado com discrição, olhares de reprovação ainda perturbam vacas que ousam dar a teta em público.

Mesmo quando praticado com discrição, olhares de reprovação ainda perturbam vacas que ousam dar a teta em público.

Para quem escolheu amamentar: liberdade. Para quem torna isso difícil: tratamento.

por Luzinete R. C. Carvalho, psicanalista

Vejo muitas pessoas, inclusive mães, falando que para evitar os olhares tortos ou comentários maldosos, bastaria que a mãe que amamenta se “preservasse” um pouco, que um simples paninho poderia resolver o problema.

A realidade é que quem assim pensa ou é a pessoa que não amamenta exclusivo, ou a que se privou de sair de casa, ou a que não amamenta na rua depois de uma certa idade do bebê, ou a que não sabe de fato o que é amamentar prolongadamente.

Quem assim pensa é, muitas vezes, quem nunca amamentou e nem nunca vai amamentar…

Para quem conseguiu amamentar só em casa, para quem conseguiu amamentar também em locais públicos com um paninho cobrindo a cabeça do bebê: ÓTIMO, que bom que deu certo.

Mas deixa eu explicar que uma mãe que escolheu amamentar exclusivamente, e em livre demanda para o sucesso da amamentação, também tem o direito e a NECESSIDADE de sair de casa.

Que a mãe que escolheu renunciar da mamadeira não pode se transformar em uma prisioneira dentro de casa, até que o bebê não precise mais mamar na rua.

E só quem amamentou um pouco mais de tempo sabe que é muito diferente amamentar um bebê de poucos meses e um bebê maior, curioso, que quer olhar ao redor, que quer olhar para a própria mãe, cheio de vida e que não quer um pano cobrindo sua cabeça.

E a escolha por amamentar um bebê “maior” não pode ser abandonada para aplacar a fúria e a hipocrisia da sociedade.

Uma sociedade que deturpa as coisas mais belas e puras, transforma tudo em objeto sexual, sem perceber depois o quanto isso fala negativamente sobre si mesma.

Sem perceber o quanto isso entrega sua ignorância e extrema limitação.

Quem escolheu a amamentação continuada, o está fazendo seguindo recomendações da OMS, da SBP, do MS, que indica a amamentação para até 2 anos OU MAIS, qualquer caixinha de leite no mercado trás esta preciosa informação.

Não ajuda nem um pouco dizer para uma mãe, que tanto se esforça e se dedica, que ela precisa “se cuidar”, que ela precisa “se preservar”, que ela “precisa se dar ao respeito”.

Uma mãe que escolheu amamentar seu filho, o fez pelos melhores e mais altruístas motivos, escolheu baseada em recomendações dos órgãos sérios já citados, escolheu pelo vínculo, pela alegria que é nutrir seu filho com seu próprio leite.

Qualquer pessoa com um mínimo de conhecimento e bom senso, se realmente quiser ajudar uma mãe que escolheu amamentar, JAMAIS dirá que ela é responsável pelo preconceito e assédio que pode sofrer.

Qualquer pessoa informada e com bom senso, se realmente quiser ajudar, tentará se livrar de seus próprios problemas em relação ao peito de uma mãe que amamenta, tentará se livrar de seus próprios preconceitos e ignorância.

Quem realmente quiser ajudar uma mãe que amamenta, apoiará que ela o faça em qualquer lugar e a qualquer hora, sem ser acuada ou agredida.

Se você se incomoda ao ver uma criança mamando, este é um problema só seu.

Você pode ter a dignidade de se retirar até que consiga superar seus problemas, até conseguir lidar de forma saudável com um peito alimentando uma criança.

Reflita.

Se necessário, procure ajuda, faça um tratamento, algum tipo de terapia.

Acredite: sua visão vai mudar e você descobrirá o quanto estava equivocado e o quanto pode ser feliz!

Ou você pode confessar o quão doente você é, de acordo com o tamanho da sua agressividade em relação a este assunto.

Mães: amamentem, eu lamento que sofram qualquer tipo de assédio ou preconceito, mas não se sintam só, não neguem a seus bebês o direito de serem alimentados com respeito e dignidade, insistam, persistam.

E não neguem a vocês mesmas o direito de sair de casa. Vocês precisam viver esta experiência com alegria e liberdade.

Peçam que os estabelecimentos lhes entreguem por escrito, em papel timbrado, quando a convidarem a se retirar com seu bebê.

Convidem as pessoas a fazerem sua refeição no banheiro ou em cubículos apertados e quentes, quando sugerirem que procure um lugar “adequado” para amamentarem seus bebês.

Diga para as pessoas cobrirem a própria vergonha quando sugerirem que cubram o peito escondendo a amamentação.

Informe com carinho e respeito na medida que forem tratadas com carinho e respeito.

Peçam ajuda a quem compreende.

Denunciem.

Tenham dentro de si a certeza de que não estão fazendo nada de errado.

Apenas saibam que o mundo inteiro é lugar para amamentar, já que o mundo inteiro é lugar para se amar.

Sim, a verdade é que amamentar é alimentar e amar um bebê.

Lembre-se que somente pelos filhos temos coragem de enfrentar qualquer coisa nesta vida, inclusive o preconceito.

Vamos mudar este mundo sim, com mais informação e com mais Amor.

 

Luzinete R. C. Carvalho é psicanalista, esposa do Renato e mãe do Francisco, que há quase cinco anos abre seu olhar, diariamente, para o encanto do mundo, da vida e dos seres humanos. Além de seu trabalho como mãe de Francisco, Luzinete contribui para a construção de famílias conscientes, integradas e felizes.

"Você comeria aqui?" é a pergunta provocadora da campanha "When nurture calls", criada pelos estudantes texanos Kris Haro e Johnathan Wenske.

“Você comeria aqui?” é a pergunta provocadora da campanha “When nurture calls”, criada pelos estudantes texanos Kris Haro e Johnathan Wenske.

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11 Comentários

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11 Respostas para “Para quem escolheu amamentar: liberdade. Para quem torna isso difícil: tratamento. (GUEST POST)

  1. Sellene Ghenov

    Querida Clarissa, obrigada por compartilhar o texto! Eu não assisti à entrevista do Sr. Daudt, mas, no trecho publicado no link acima, acredito que a intenção dele era buscar uma explicação para essa bobagem do preconceito em relação à amamentação, por mais bizarro que seja o comportamento das pessoas. Pareceu-me até que ele é a favor de as mães ignorarem esses olhares toscos, o ciúme das esposas alheias, etc. Meu filho está com 2 anos e 1 mês e eu nunca tive problema algum em amamentar em público. E nunca o fiz com paninho nem nada, pois se fosse comigo eu teria agonia, ficaria sem ar. Seja o local que for, eu coloco o seio para fora e deixo meu bebê escolher a posição mais confortável para ele. Quem vai decidir até quando teremos esse prazer mútuo seremos eu e ele. Entre mim e minha mãe, essa parceria durou 5 anos e 10 meses. E, mais de 30 anos depois, eu me lembro até hoje o quão gostosos eram aqueles momentos! Beijos, Sellene Ghenov

  2. Escolhi amamentar levando meu leite na mamadeira : )
    Já ouvi de muita gente que isso é um absurdo também. Eu acho que a melhor coisa é a liberdade de escolha. Quer dar no peito? Dá. Quer cobrir? Cubra. Quer mostrar? Mostre. Quer tirar na bombinha e levar na mamadeira? Tire. Não quer amamentar? Não amamente. O importante é a criança receber leite materno até pelo menos os 6 meses de idade. Como será feito, não importa. Mas que é revoltante que peitos amamentando choquem tanto quando vivemos ao redor de outdoors e todo tipo de publicidade enaltecendo o corpo feminino em comerciais sensuais, isso é.

  3. Fga. Mariane Malatesta

    Desculpe Sellene, mas descordo de você, se essa era a intenção dele usou as palavras erradas. Quando ele diz que “a mulher que amamenta em público se esquece que o peito é também um ícone sexual”, isso demonstra a completa inversão de valores, o resto do mundo é que esquece que a função primária do peito feminino é a amamentação. Um decote siliconado à mostra, uma exposição desnecessária em público do corpo, isso sim deveria nos causar espanto, mas é cada dia mais “normal”. Portanto temos que evitar o Natural para dar espaço ao conceito deturpado de “normal”? Não!
    Além de depoimento pessoal gostaria de complementar as riquezas da amamentação com uma visão profissional, que vai além da nutrição em saúde primária, amamentar fortalece a musculatura oral, língua, lábios e bochechas e também adequa o crescimento dentário, assim propícia um desenvolvimento adequado da fala evitando as alterações mais corriqueiras no consultório fonoaudiológico.

    • Sellene Ghenov

      Mariane, boa-tarde! É justamente isso o que acontece comigo! Quando estou amamentando o meu filho, seja na privacidade da minha casa, seja em um parque público, eu me esqueço completamente de tudo: de quem está à volta, do quanto isso pode afetar alguém, do que o peito representa aos olhos dos outros… Em suma, eu simplesmente esqueço do resto do mundo, pois me foco apenas naquele momento só meu e do meu filho. O “resto do mundo” nunca vai interferir na minha decisão de continuar amamentando, seja onde for. Como salientei em meu comentário, eu não vi a entrevista completa e talvez deva fazê-lo para compreender o contexto mais amplo, porém essa frase poderia ser dita por qualquer mulher que considera a amamentação muito mais importante do que qualquer receio ou preconceito. Abraços, Sellene

  4. Adriana Agustini

    Gente, que maravilhosa essa matéria e essas contribuições. Amei!!!! Também amamentei meus quatro filhos e foi um período mágico e muito importante para minha como mãe e meus bebês. Eu sempre a favor do natural, e não via nenhuma conotação sexual no ato de amamentar em público, apenas procurava ficar num ambiente mais calmo sem muito barulho para que o bebê pudesse mamar tranquilamente. Sempre me senti realizada como mãe e feliz de poder dar ao meu filho o melhor alimento que ele pode receber nos primeiros meses: o leite materno.
    Abraços à todas as mamães e futuras mamães.
    Adriana

  5. Gostei muito , pois constantemente me dizem que devo cobrir – me para amamentar , se pra nos que somos adultos seria agoniante comer com o rosto coberto imagine uma criança .

  6. Ana Carolina

    Gostei muito do post. Muito bem argumentado e que nos faz refletir, realmente. De fato acho que o mais importante é a mãe poder decidir como ela quer fazer porque antes de tudo, é o seu corpo. Pra mim, a amamentação foi um processo tranquilo e muito prazeroso! Mas, de fato, não gostava de faze-lo em locais públicos. Não me sentia à vontade. Às vezes mesmo em casa com muitos amigos, no momento inicial da amamentação era algo que eu não gostava de fazer na frente dos outros. Talvez eu não precisasse me sentir assim? É… talvez não. Mas é por isso que eu acredito que cada mãe deva fazer suas escolhas porque são os seus sentimentos, sua experiência. E nem acho que o certo é amamentar pelo menos até os 6 meses ou coisa assim…. o certo, na minha opinião, é que a mãe deve amamentar até que ela sinta que é bom pra bebê e pra ela. E Ponto! Sei que esta experiência não é legal para algumas mães, por diversos fatores, e isso deve ser respeitado. Dev ser respeitado pela prórpia mãe porque os outros… os outros vão falar de tudo! E os outros vão falar…..falar…. mas quem está lá vivendo é a mãe!

  7. Cassiane Roque

    Fiquei encantada com seu blog parece qe foi feito pra mim rs…
    Me dá um consrlho meu filho tem 10 meses ele só quer saber de peito não come absolutamente nada já tentei de tudo mais sem sucesso tem pessoas qe até acham qe eu qe tenho preguiça de cozinhar pra ele não sei mais o qe fazer me ajudem!

  8. Luciana

    O grande problema que vejo na amamentação em público, não é o pensamento da mãe, pois ela está simplesmente atendendo à uma necessidade de seu filho e preocupada apenas com isso, mas sim a sexualidade vista em um órgão feminino que serve exclusivamente para a amamentação. Deus nos fez assim justamente para amamentarmos, então porque temos de esconder os seios?? O que os homens têm na cabeça que exitam-se quando vêm uma mulher com os seios a vista??? Se aqueles seios não foram feitos para ele??? Penso que o problema é justamente o fato de que fomos ensinados a esconder nosso corpo, e isso gera curiosidade aos outros, então quando vêem tal coisa que sempre é escondido, desperta interesse. É o que acontece com tudo no mundo, tudo aquilo que não podemos ver, quando vemos, ficamos deslumbrados. Infelicidades do mundo em que vivemos. Eu, particularmente, não gosto muito da ideia de amamentar em público, eu não conseguirei fazer isto, não por causa de pensamentos meus, mas justamente por saber que a maioria das pessoas pensam o contrário de mim e vão me olhar torto ou com curiosidades.

    • Obrigada pelo comentário, Luciana. Antes de ter filhos, muitas mulheres pensam assim. Aí vem o parto, o bebê, e o puder vai embora. Pelo menos para muita gente é assim. O bebê chora e você tá na rua: faz o que? Amamenta, ué! E danem-se os outros. Espero que com você seja assim. Porque quanto mais gente amamentar em público, mais normal é e menos os outros se chocam. Abraço, Clarissa

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