Arquivo do mês: fevereiro 2012

SBP, Nestlé e como essa aliança afeta você (parte 1)

Há uma semana, entrei no site da SBP (Sociedade Brasileira de Pediatria) e dei de cara com o logo da Nestlé. Fiquei tão indignada que estou com um gosto amargo na boca até hoje. Esse patrocínio de difícil digestão é de uma incoerência, uma cara de pau e um mau gosto tão grotescos que decidi escrever meu primeiro post com teor “político”. Como o assunto é muito abrangente e complexo, será separado em partes. Não quero usar o blog para desabafos nem para levantar bandeiras, mas, nesse caso, foi impossível ficar calada.

Porque eu sei de tudo o que a Nestlé (entre outras) já fez e continua fazendo em desserviço à amamentação no Brasil e no mundo. E sei que a saúde infantil não é do interesse deles. Se fosse, não estariam vendendo leites artificiais e sim promovendo a amamentação; não estariam comercializando comidas a base de farinha e açúcar e sim divulgando os benefícios de uma nova maneira de alimentar nossas crianças; não estariam incentivando o “fast food infantil” (i.e. potes de alimentos triturados) e sim soluções para oferecer comidas de verdade, frescas e vivas, para seres humanos em desenvolvimento. A verdade é que a missão dos fabricantes de fórmula infantil (lucrar com a venda de alimentos processadas) é totalmente contrária aos objetivos da SBP, que é, ou deveria ser, zelar pela saúde das crianças brasileiras.

Já imagino os protestos: “Ah, ‘pera lá, Clarissa, não precisa demonizar a Nestlé. Afinal, vivemos numa sociedade capitalista e não há nada de errado em enxergar uma “demanda” por leite artificial e correr atrás desse mercado. E a Nestlé fabrica um produto que salva vidas de bebês que não podem amamentar.” Sim, sim, aceito a premissa capitalista e acredito (bom, tento acreditar) que essas empresas se empenham para oferecer um produto de qualidade para seus consumidores. O problema é a questão da demanda. Porque a Nestlé (e outras empresas, mas ela primordialmente) não simplesmente enxergou uma demanda existente (no caso, bebês ou mães que não conseguiam amamentar): ela ativamente criou essa demanda, convenceu os pediatras a legitimá-la e fomentou mitos como “o leite artificial é um substituto adequado ao leite materno”, “pouco leite é um problema real” e “amamentar é um estresse desnecessário na vida da mulher moderna”.

Mas antes, como sei que corro o risco de ser taxada de “xiita da amamentação”, quero deixar bem claro o seguinte: sou a favor do direito de optar pelo aleitamento artificial. Preparado da maneira correta, com mamadeiras e bicos higienizados, o leite artificial é seguro e, portanto, é uma escolha aceitável para quem não pode ou prefere não amamentar. Mas o direito de optar pressupõe acesso a informação correta e de confiança; caso contrário, é uma imposição disfarçada de “escolha”. Em outras palavras, a opção pelo aleitamento artificial não pode ser o resultado de mitos, mentiras ou falsas indicações médicas. Mas a realidade é justamente essa: um campo minado de mitos e mentiras, compradas inclusive por alguns pediatras (cortejados e seduzidos pelos fabricantes de leite artificial) e pela sociedade como um todo. Infelizmente, como pretendo mostrar, a Nestlé e as outras empresas (com o apoio da classe médica) venderam para o público informações enganosas. O propósito dessa série de posts é falar sobre o aspecto econômico e político da amamentação e, por fim, oferecer algumas dicas para que você não se torne vítima de uma situação que enche os bolsos dos acionistas dessas empresas e dos pediatras que os apoiam.Vamos por partes.

Mentira #1: o leite artificial é um bom substituto do leite materno

Desde que foi criado o processo de fabricação de leite em pó, empresas como a Nestlé buscaram um público para sua invenção – entre seus consumidores em potencial, jovens mães querendo ou precisando, especialmente por razões econômicas, se libertar da “árdua tarefa” de amamentar. O primeiro passo era vender a ideia de que seu produto era seguro e adequado. Anúncios como este de 1903 sugeriam que o alimento desenvolvido pela Nestlé produzia bebês fortes e rechonchudos que se tornariam “os trabalhadores do futuro”. O que esses anúncios não mostravam (óbvio) é que, na época, 20% dos bebês que tomavam essas fórmulas não sobreviviam ao primeiro ano de vida (comparado a 3% para bebês que mamavam no peito). Felizmente, desde então, práticas de higiene melhoraram e as empresas investiram muito para aprimorar seu produto. Mesmo assim, a mortalidade infantil de bebês que não tomam leite materno é duas vezes maior que a de bebês que mamam exclusivamente no peito – e esse é o índice para países desenvolvidos.

Mas isso não impede os fabricantes de leite artificial de tentarem convencer o público do valor de seu produto. A cada descoberta das propriedades incríveis do leite humano, as empresas correm para tentar incorporar novos benefícios a sua fórmula; recentemente, foram os ácidos graxos essenciais e os probióticos. Tudo isso para que nós, começando pelos pediatras, compremos a ideia de que o leite artificial (LA) é “quase tão bom quanto” o leite materno (LM). As empresas fabricantes de LA querem que a gente acredite que, se o LM representasse a nota “10”, o LA seria um “9”. Desculpa, mas isso não é verdade. Há uma diferença enorme entre ser “adequado” e ser “quase tão bom quanto”. O leite artificial é apenas adequado. Ele não chega aos pés do leite materno humano. O leite artificial pode engordar seu bebê e fazê-lo crescer e se desenvolver bem, mas é apenas adequado. Além de conter substâncias que não são próprias para bebês humanos (a proteína do leite de vaca), não  é um alimento vivo, não responde às necessidades particulares daquele bebê naquele momento e não contém uma série de substâncias que protegem e melhoram sua saúde (anticorpos, células-tronco, bactérias benéficas, entre outras substâncias que ainda serão descobertas). Portanto, o leite artificial é apenas um pobre substituto do leite humano. Se eu tivesse que dar uma nota, seria “6” – dá pra passar de ano, mas não é lá grandes coisas. Saiba que a Organização Mundial de Saúde recomenda fórmulas infantis somente como uma quarta opção, depois do leite direto do seio materno, o LM oferecido em copinho ou mamadeira, e o leite de outra mulher via bancos de leite materno ou ama de leite. E o seu pediatra, diz o mesmo?

Pense nisso, espalhe a notícia dessa aliança e, se quiser saber mais sobre as táticas da Nestlé e de suas concorrentes, dá uma espiadinha nesse texto (em inglês). Prometo publicar a parte 2 em breve.

 

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Bebês e tecnologia: a tentação do entretenimento constante

Uma profusão de iPads e outros brinquedinhos eletrônicos invadiu as mesas dos restaurantes cariocas nos fins de semana. Em todo lugar que vou há no mínimo uma criança vidrada numa tela, totalmente submersa num universo virtual. E, para cada criança dessa, seja na vida real ou virtual, há adultos babando a “genialidade” dessa nova geração que parece nascer já segurando um iPad ou celular. Não tenho nada contra aparelhos eletrônicos – inclusive acabei de trocar meu celular velho por um iPhone e raramente saio sem o meu Kindle. Portanto, reitero: não sou antitecnologia, de jeito nenhum. Mas quando crianças entram nessa equação sou um pouco questionadora sim: será que o efeito de tantas telas, botões e estímulos em suas mentes e corpos em desenvolvimento é positivo?

toddler on ipad

Procurei no site da Sociedade Brasileira de Pediatria algum posicionamento sobre o assunto. Não encontrei. Aliás, o que encontrei me incomodou tanto que já está se transformando no próximo post. Mas, voltando a este, não sei o que os pediatras brasileiros têm a dizer, mas a Academia Americana de Pediatria é categórica: ela recomenda evitar que crianças de menos de 2 anos sejam expostas à televisão (seguindo a lógica, isso vale também para outros gadgets com tela). A razão pela recomendação é complexa e baseada em vários estudos que sugerem uma relação entre tempo assistindo televisão e, entre outros, obesidade infantil, déficit de atenção e atraso no desenvolvimento da linguagem.

Você deve estar achando essa recomendação meio radical ou, no mínimo, irreal. Pode ser mesmo. Mas o fato de esta entidade importante ter achado necessário proibir as telinhas na vida dos pequenos sugere que devemos, no mínimo, fazer um esforço para chegarmos às nossas próprias conclusões: afinal, qual poderia ser a consequência da tecnologia em suas vidas e que limites devemos impor a ela?

Não vou resumir as pesquisas citadas pela Academia Americana de Pediatria. Quero opinar sobre esse fenômeno e compartilhar algumas hipóteses que têm pipocado na minha mente. Minha opinião, para variar, é um pouco contrária à de grande parte da população. Não acho “uma gracinha” nem “genial” um bebê de um ano mexendo com maestria num iPad; isso não é prova de que “as crianças de hoje são mais espertas”. Passar o dedinho no iPad é moleza em comparação à coordenação necessária para virar uma página de livro ou segurar um lápis. Saber mexer no iPad é tão natural para eles quanto apertar um botão num brinquedo de plástico era na nossa época. Bebês aprendem o que veem, e se estão vendo os pais no iPad, com sua tela colorida que responde ao menor toque, claro que vão aprender a mexer nele também – e vão achar o máximo perceber como podem “influenciar” o ambiente só com seu dedinho. Nada mais normal. E milenar.

O que me preocupa é a possibilidade dos eletrônicos – por serem mais simples, controláveis e, muitas vezes, mais divertidos que as pessoas – se tornarem mais prazerosos e familiares do que o contato com seres humanos. Afinal, seres humanos não são previsíveis e nem sempre agem como gostaríamos. Os eletrônicos, em comparação, prometem uma gratificação instantânea e uma relação hierárquica clara: nós somos o mestres e, eles, os escravos. Que relação mais tentadora – e perigosa – para uma criança aprender, sobretudo numa fase tão delicada como a primeira infância.

Também acho desconcertante ver um neném de meses mais interessado no desenho imbecil passando numa tela de 40 polegadas do que nas pessoas a seu redor. Desenhos e joguinhos eletrônicos têm sim aspectos positivos, mas não para bebês. Bebês precisam de contato com pessoas, precisam ser expostos à linguagem, ao toque físico, precisam desenvolver suas habilidades motoras grossas (girar, sentar, engatinhar, andar, correr, se equilibrar) e finas (apontar, segurar uma ervilha, um lápis, direcionar os movimentos). A televisão, o iPad, o computador e o celular não auxiliam nesse aprendizado e podem até atrapalhar. Bebês definitivamente não precisam deles para se desenvolverem bem, e o contato com recursos tão sedutores pode, pelo menos em tese, distraí-los a tal ponto que venha a ser prejudicial a seu desenvolvimento psicossocial nesse mundo repleto de pessoas, tarefas e momentos chatos e desinteressantes, porém importantes.

E por falar em distração, não posso deixar de citar o argumento de que alguns pais que conheço, que defendem que a televisão é mais para os pais “terem um momento de descanso” do que qualquer outra coisa. Não vou negar que deve ser um alívio e tanto. Mas eu tenho uma dificuldade em aceitar a lógica por trás disso. Quem disse que seu filho precisa estar “estimulado” ou “entretido” a todo momento? Será que esse entretenimento constante – barulhos, cores, ação e imagens em movimento – não está, sem querer, criando expectativas irreais sobre o mundo e o futuro que os espera fora das quatro paredes de seu lar? Quando seu filho tiver que prestar atenção na aula de matemática será que vai conseguir? Quando for preciso esperar sentado a refeição no restaurante será que vai aguentar? A vida tem momentos de tédio e é preciso aprender a lidar com eles.

Isso me traz à questão da imaginação. A imaginação é um recurso usado para vencer adversidades como o tédio, a tristeza, o desconhecido, o medo. Ver televisão, jogar joguinho e mexer no iPad não estimulam a imaginação. Não sou especialista, mas, na minha opinião, as telas, de maneira geral, não nos convidam para criar; as formas, as cores, os sons já estão todos ali, e não sobra muito espaço em branco para a criança preencher com imagens, cores e sons da sua própria mente. Um livro, uma folha de papel, um brinquedo, o silêncio, por outro lado, são convites perfeitos para o exercício da imaginação. O valor dessa ação criativa da mente não deve ser menosprezado, sobretudo na infância.

Quero deixar claro que não estou propondo abolir a tecnologia da vida das crianças. Não é isso! As telas fazem partes de suas vidas, isso não podemos negar. Mas refletir sobre seus possíveis efeitos é uma questão de responsabilidade. A que ponto estimulamos a dependência em eletrônicos em nossos filhos para, na verdade, facilitar a nossa vida, seja por preguiça ou por não sabermos como lidar com os eventuais momentos difíceis? Será que, ao invés de ligar a TV na hora da janta, você não pode aproveitar para focar no prazer da comida, seus sabores, texturas, aromas? Ao invés de botar um iPad na  frente da criança para “ajudá-la” a lidar com o tédio no restaurante, que tal inventarem juntos joguinhos ou brincadeiras que podem ser feitas na mesa? Em vez de investir num aparelho de DVD para ter no carro, por que não ligar o rádio ou simplesmente viajar em silêncio, permitindo a seu filho um momento de contemplação? E, na hora de comprar um brinquedo para satisfazer aquela ânsia por novidade e estímulo, que tal oferecer um desses 5 brinquedos, apontados por um contribuinte da revista Wired.com como os melhores de todos os tempos?

Digo tudo isso porque, apesar de estarmos no século XXI, o mundo não mudou tanto assim. Continuamos sendo seres primordialmente sociais. Precisamos aprender a conviver em grupo, interagir, olhar nos olhos, amar e perdoar. Precisamos aprender a controlar nossos impulsos e a adiar a gratificação (já ouviram falar no famoso teste do marshmallow?). Temos o ímpeto de criação e, para isso, precisamos desenvolver o poder da imaginação. Nossos corpos também precisam de movimento, de desafios, de diversão. E para tudo isso, convém desligar a TV ou o notebook, guardar o iPad ou o joguinho eletrônico, e viver o momento presente com todos os sentidos – mesmo quando (ou especialmente quando) esse momento seja puro tédio.

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Sete razões para não marcar o seu parto

Compreendo a opção pela cesárea; entendo de onde vem o receio de parir um bebê, sei da falta de informação e de apoio (do médico, da família, da sociedade) ao parto normal e me conformei com a visão vigente de que a via cirúrgica é uma alternativa aceitável. O que não entendo e não vou aceitar nunca é a banalização das cirurgias agendadas sem indicação, às vezes com 36 semanas, como no caso de uma amiga virtual de Facebook, que revelou seu desespero ao saber que sua cunhada, por sugestão do obstetra, havia agendado sua cesária para antes das 37 semanas. Essa criança provavelmente nascerá prematura, precisará passar tempo na UTI neonatal, terá dificuldades iniciando a amamentação, receberá complemento… Enfim, sua vida não terá um começo fácil. O mais triste é que tudo poderia ter sido evitado se seus pais tivessem esperado sua hora de nascer.

Abaixo, ofereço sete motivos para você esperar os primeiros sinais de que o seu bebê esteja pronto para vir ao mundo ao invés de cair no conto do vigário (ou seja, do “lobo cesarista”) e marcar uma cesárea “de emergência” para daqui a uma semana (isso não é emergência – é conveniência, tá?).

1. Saúde

A saúde sempre vem em primeiro lugar, não é mesmo? Toda mãe deseja, antes de mais nada, que o filho seja saudável. Todo obstetra se orgulha em dizer que preza pela saúde do bebê (muitos até usam isso como desculpa para desencorajar o parto normal, o que é uma ignorância e uma covardia sem tamanho, mas isso é outra história). A literatura médica é categórica: cesáreas eletivas feitas antes de completar 39 ou 40 semanas aumentam significativamente (entre 300 e 500%) o risco de problemas de saúde no bebê, especialmente respiratórios (que podem persistir durante toda a infância), mas também de icterícia (que dá ao recém-nascido um aspecto amarelado e está relacionado ao acúmulo de bilirrubina no sangue) e dificuldades para amamentar. Para todo bebê que nasceu “sem sequelas” numa cesárea de 37 semanas (que não é considerado prematuro, mas que poderia ter ido até 40, 41 ou 42 semanas – ou seja, é sim pré-termo), há vários que precisaram ficar “em observação” por dificuldades respiratórias ou foram receitados complemento no berçário ou receberam fototerapia por icterícia, e achamos isso “normal” porque, infelizmente, a prematuridade tardia (entre 34 e  36 semanas +6 dias) e o a termo precoce (entre 37 e 39 semanas) se tornaram comuns na nossa sociedade. Porém as evidências demonstram algo inconveniente: os males de saúde aumentaram depois que nós começamos a adiantar o nascimento dos nossos filhos. O que me leva, necessariamente, ao próximo ponto.

2. Ética

Clamamos por um mundo com muito mais ética. Demandamos isso dos políticos e dos empresários, mas, por alguma razão, simplesmente acreditamos piamente na ética do nosso médico. De certo modo, faz sentido. Afinal, o médico é alguém que escolheu preservar e proteger a vida e, teoricamente, por uma causa nobre. Fez o milenar juramento hipocrático, onde promete “não causar dano ou mal a alguém”. A verdade, pelo menos na obstetrícia, não é bem assim. A prematuridade iatrogênica (causada pelo procedimento médico em si – ou seja, por partos agendados) está aumentando assustadoramente. É por causa dela que os índices de prematuridade são muito maiores nas regiões sul e sudeste (curiosamente, aonde tem mais cesáreas). Infelizmente, a lei do mercado se sobrepôs ao juramento de não fazer mal, e muitos médicos (não todos, mas muitos) –  para maximizarem seus rendimentos e não precisarem acordar de madrugada nem deixar de viajar no feriado – agendam partos na 37a semana, mesmo conhecendo as estatísticas acima. Há uma falta de punição para esse tipo de comportamento e, portanto, cada vez mais profissionais agem desta maneira condenável. Se você acredita na ética e no que é correto, você pode ajudar o seu médico a não desrespeitar o juramento que fez e não concordar em marcar uma cesárea antes da data. E lembre-se: mesmo que 37 semanas não seja considerado prematuro, a não ser que você tenha feito tratamento para engravidar e saiba exatamente o dia em que ovulou e/ou engravidou, a idade gestacional do seu filho é meramente uma estimativa. Uma gestação a termo é 40-42 semanas (somente depois de 42 semanas é que o bebê é considerado pós-termo).

3. Respeito

Como relatei no post O nascimento, do ponto de vista do sujeito, o bebê não é um mero produto do parto, mas um agente ativo. É ele quem envia os sinais para o cérebro da mãe, assim desencadeando trabalho de parto. O anúncio (ao lado) da ONG americana March of Dimes, instituição empenhada em melhorar a saúde materna e infantil, mostra claramente que algumas semanas fazem uma diferença enorme no desenvolvimento do cérebro fetal. Portanto, fica claro que agendar o parto é desrespeitar a fisiologia do bebê. Sem contar que, muitas vezes, na hora da cirurgia o bebê está dormindo, totalmente despreparado para “ser nascido”, e, assim, o nascimento se torna um choque e, ao meu ver, uma agressão. Você quer que o primeiro contato do seu filho amado com o mundo fora de você seja assim, um susto e possivelmente um trauma? Não é melhor respeitar o tempo dele e deixar que os abraços (contrações) do seu útero o preparem para nascer, mesmo que seja via abdominal?

4. Amor

Você já ouviu falar na ocitocina? Também conhecido como “o hormônio do amor”, a ocitocina é uma das substâncias responsáveis pela sensação de conexão, confiança e empatia. O orgasmo depende da liberação desse hormônio e a amamentação também, mas a maior concentração sanguínea do hormônio do amor na vida de uma mulher ocorre durante o trabalho de parto. Não é incrível? Estima-se que essa é a razão pela qual mulheres que parem naturalmente alegam sentir uma ligação profunda e imediata com o filho (um amor instantâneo) enquanto muitas mulheres que não tiveram esse privilégio admitem que a amor visceral pelo filho foi construído. Calma – não estou dizendo que quem tem parto normal ama mais o filho, por favor! O amor é muito mais do que simplesmente hormônios – é social, espiritual e um esforço diário – mas passar pelo trabalho de parto e sentir pelo menos uma fração dessas substâncias prazerosas e incríveis circulando pelo corpo deve ser o máximo. E pode tornar o conturbado período pós-parto um pouco mais ameno.

5. Paciência

A paciência é uma virtude que está se perdendo. Hoje em dia tudo é urgente, é “pra agora”, e a pressa é quase universal. Até quando estamos entre compromissos, no trânsito ou no metrô, sentimos uma pressão por estar “produzindo” – checando emails no smartphone, lendo jornal, resolvendo um problema no telefone… (In)Felizmente, um bebê chega para mudar tudo isso. Crianças requerem paciência. Elas têm o próprio ritmo e tempo, e testam nossa paciência constantemente, seja com suas constantes necessidades (mamadas, fraldas, choros) ou no processo natural de aprendizado (já reparou como precisam repetir tudo infinitas vezes?). Portanto, ter a paciência para esperar a hora de seu filho nascer, conforme manda a natureza e a fisiologia, pode ser uma boa forma de se acostumar com sua nova realidade como mãe – uma realidade onde a paciência será imprescindível para a sua felicidade e sanidade.

6. Espírito de aventura

Eu adoro ouvir a história de como nasci. Minha mãe acordou de madrugada toda molhada, sentindo somente “umas cólicas” e achando que tivesse feito xixi na cama. Precisou ser convencida pela sogra de que estava em trabalho de parto e que a bolsa havia rompido. Chegou no hosptial com 8 cm de dilatação e pariu algumas horas depois. Deve ter sido uma aventura e tanto! Pessoalmente, acho triste que a grande maioria das crianças sendo nascidas hoje teve essa primeira aventura “roubada” – e suas mães também! As mães não vão deixar uma plateia inteira na expectativa, com cara de “quero mais”, ao contarem como sentiram as primeiras contrações, a dúvida de estarem ou não em trabalho de parto, a saída do tampão, o frio na barriga ao perceberem que chegou a hora, os telefonemas de madrugada, o taxista/marido nervoso… Elementos de uma verdadeira história de ação! Quando a geração de hoje perguntar  como foi seu nascimento, vai ouvir que o parto foi marcado para o dia tal na hora tal e que ponto final. Pode me chamar de romântica, mas eu encaro a vida como uma grande aventura e da mesma forma que não escolhemos o dia da nossa morte, acho que ao escolherem para nós o dia do nascimento, roubamos um pouco da magia de viver. Deixe o seu filho embarcar nessa vida com o espírito de aventura que ele precisará para aproveitar ao máximo sua temporada aqui na terra.

7. Paz

Tem gente que diz que quando nasce um mãe, nasce junto a mãe culpada, sempre se perguntando se está fazendo o certo, cheia de ansiedades sobre a saúde e bem estar do filhote, com mil e uma perguntas para fazer ao pediatra, à sua mãe, às amigas (íntimas e virtuais)… Tudo isso é normal. A insegurança, as dúvidas e os questionamentos fazem parte do processo. Mas o nível pode ser tolerável ou patológico. Quando você adentra a maternidade impondo conveniências alheias ao processo, negando a seu filho o direito de determinar a hora certa para ele, você já começa “brincando com fogo”, mexendo num processo natural e aumentando o risco de ter problemas mais na frente. Você quer acrescentar mais essa culpa? Não é simplesmente mais fácil respeitar a infinita sabedora desse processo milenar e aguardar, paciente e respeitosamente, o dia e a hora que o destino lhe reservou para dar a luz?

Como você pode ver, numa gravidez normal, de um bebê saudável, o melhor mesmo é esperar a hora “P” chegar. Seu médico pode alegar várias coisas – placenta grau 3, feto macrossómico (grande), cordão enrolado, pressão alta (sem pré-eclampsia), cesárea prévia: nada disso é indicação de cesárea, muito menos de cesárea agendada. Exceto em casos de pré-eclampsia, placenta prévia, placenta abrupta e outras (poucas) ocorrências emergenciais, qualquer cesárea pode ser feita durante o trabalho de parto, com melhores resultados para a saúde do bebê.  Enfim, esperar o trabalho de parto é muito mais do que “simplesemente” mais seguro. É sinônimo das virtudes acima: saúde, ética, respeito, amor, paciência, espírito de aventura e paz.

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Como escolher um carrinho?

Como disse em outro post, tenho verdadeira obsessão por carrinhos de bebê. Cheguei até a parar estranhos na rua para saber se estavam gostando do modelo escolhido (uma marca que nunca tinha visto por essas bandas). Não sei se essa paixão está relacionada a minha temporada na Dinamarca (onde o carrinho é crucial!), mas acho que de todas as decisões referentes ao enxoval do bebê – com a possível exceção dos móveis e decoração do quarto – a escolha do carrinho é a mais importante. Afinal, o carrinho será uma peça chave na sua vida a partir da chegada do bebê (a não ser que você pretenda usar o sling exclusivamente, o que eu acho o máximo, mas que não é o desejo da maioria).

O Quinny Zapp Xtra é compacto, versátil e descolado, mas a suspensão e cesta diminuta podem não agradar a todos.

Não existe carrinho perfeito – muito menos “o melhor” carrinho do mundo – pois cada família tem suas necessidades, preferências e especificidades. Infelizmente, no Brasil, as opções são restritas e a relação custo-benefício baixíssima. Recomendo para quem tem o luxo de poder comprar um carrinho no exterior que o faça, pois os carrinhos lá fora são melhores, mais baratos e as opções quase infinitas. Qualquer que seja sua condição financeira e oportunidades de viagem, vale a pena pensar muito bem sobre qual carrinho comprar, porque além de ser um dos principais “acessórios” na primeira fase da maternidade, ele ficará com você por no mínimo 2 anos (podendo inclusive ser aproveitado por outros filhos no futuro).

Ao invés de recomendar as marcas X, Y ou Z (mas no final incluirei alguns nomes para vocês pesquisarem), vou colocar aqui uma série de perguntas para ajudar você a decidir qual perfil de carrinho seria o mais adequado para você. Sugiro que você leve em conta quatro fatores fundamentais e um último que não é essencial, mas que pode ser levado em consideração. São eles: função, conforto, medidas, orçamento e visual.

Função: o carrinho é para quem e para quê?

Essa resposta pode parecer óbvia: “Pra transportar meu bebê, oras!” Mas não é tão simples. Porque um carrinho para transportar um bebê recém-nascido é diferente de um carrinho  melhor para levar um bebê de 18 meses, ou de gêmeos, por exemplo. Também é preciso levar em consideração questões importantes relacionadas ao estilo de vida da família – como os programas que fazem nos finais de semana, a condição das ruas das redondezas, a duração dos passeios etc. Procure responder as perguntas abaixo:

O UppaBaby Vista foi projetado originalmente para um bebê só (single stroller), mas, com os acessórios, cabem até 3 crianças!

1. Para quem é o carrinho – para um recém-nascido, um bebê maior, gêmeos, dois bebês próximos em idade (ex. um recém-nascido e um bebê de 1 ano) etc.? Um recém-nascido precisa de um carrinho que tenha um assento reclinável em no mínimo 145 graus (quase deitado reto) e deverá ter a opção de encaixar o bebê conforto (cadeirinha do carro). Também considero bem importante a opção de ter o bebê virado para quem empurra (assento reversível). Um bebê mais velho também poderá tirar eventuais sonecas no carrinho, mas o assento reclinável passa a ser opcional e muitos pais de crianças mais velhas optam por um carrinho mais leve (mais fácil de transportar) já que o filho não passará tanto tempo dentro dele. O de gêmeos precisa caber dois, obviamente. E, para quem têm dois filhos em idades differentes, existem opções de carrinho que podem ser transformados em verdadeiros veículos de transportar pimpolhos (até três de uma vez!). Existem até carrinhos próprios para pais atletas – os famosos “jogging strollers” com três rodas enormes!

2. Ele será usado mais em pisos lisos (como shoppings, calçadas bem asfaltadas, interiores) ou mais na rua esburacada e falha da cidade? Para pisos lisos, a suspensão não precisa ser nenhuma Brastemp, mas para usar nas ruas esburacadas e desniveladas (como as do Rio, por exemplo), uma suspensão boa é um “must”.

3. Quanto tempo, mais ou menos, o bebê ficará fora de casa com o carrinho? Quanto mais tempo, mais importante é investir num carrinho confortável, com assentos acolchoados e, igualmente importante, com uma cesta decente que caiba tudo que ele precisará nos passeios mais longos (fraldas, brinquedos, troca de roupa, comida, água etc).

4. Onde o carrinho será usado, primordialmente? Se você pretende usar o carrinho muito em shoppings e lugares com corredores estreitos, vale e pena prestar atenção na largura. Alguns podem ser verdadeiros trambolhos, que dificultam muito a vida de quem transita em lugares estreitos. Se ele vai viver entrando e saindo do carro, também convém levar em consideração o peso e a facilidade em fechar e abrir.

Conforto: esse carrinho é confortável para meu filho? E para mim?

Um carrinho pode ser confortável para o bebê, mas desconfortável para quem empurra; um exemplo seria um carrinho com suspensão decente e assento acolchoado, mas que é duro de manobrar e precisa ser empurrado com duas mãos (como o Peg Perego Pliko P3 – o mais comum na Zona Sul do Rio, por razões que me espantam, pois acho um carrinho que deixa muito a desejar em termos de manuseio e visual). Por outro lado, pode ser o contrário: tranquilo de empurrar e leve, proporcionando conforto para você, mas sem nenhuma suspensão ou acolchoamento no assento, resultando num passeio incômodo para o pequeno passageiro (como no caso de muitos carrinhos “guarda-chuva” por aí). Outra coisa importante para se levar em consideração é a proteção contra o sol: é grande o suficiente para proteger do sol, tem a opção de descer mais, é arejado? Eu também incluiria no quesito “conforto” a possível frustração diária que você pode ter se optar por um carrinho de má qualidade, cujo mecanismo trava, que seja duro de abrir e fechar e que não caiba direito nos seus espaços. O que me leva ao terceiro ponto…

Medidas: esse carrinho cabe na minha vida?

Qual o tamanho da sua casa? Do porta malas do carro? Do elevador? Dos corredores dos lugares que frequenta? Das calçadas do seu bairro? Não deixe de pensar nessas questões antes de comprar um carrinho gigante, com a melhor suspensão do mundo e lugar para por seu iPod, e depois perceber que o bicho não entra no seu elevador.  Mas lembre-se: carrinhos menores costumam ser menos confortáveis (em termos de suspensão e posições para o bebê). Às vezes, um carrinho que parece grande fecha num tamanho razoável. Quando estiver pesquisando as opções, procure anotar as medidas (“dimensions”) tanto do carrinho aberto quanto fechado.

Orçamento: quanto estou disposta a gastar?

Uma das razões pela qual vale a pena viajar para o exterior na gravidez é que, além de fazer uma viagem gostosa com o maridão (a última sozinhos em um bom tempo!), você poderá comprar itens do enxoval com um custo-benefício muito melhor. Um carrinho de luxo lá fora custa mil dólares – ou R$1.800, o preço de um Peg Perego aqui. E você pode comprar um carrinho maravilhoso, perfeito para você, do seu gosto e ideal para o seu estilo de vida, por muito menos que isso. Como em tudo na vida, as opções mais caras costumam ser também as de melhor qualidade, com suspensão e manuseio superior, além de virem com itens de luxo, como capa de chuva, mosquiteiro, e um visual bem mais interessante, além de terem acessórios como adaptador para a cadeirinha do carro, porta-bebida, guarda-sol, entre outros. No entanto, é importante levar em consideração que nem sempre o mais caro é o melhor: muitas vezes, você estará pagando pela marca e pelo visual.

Visual: que tipo de carrinho quero desfilar pelas ruas da minha cidade?

A já chiquérrima Bugaboo se uniu à marca Missoni para uma edição especial de seu modelo compacto, o Bee.

Como qualquer acessório, o carrinho também acaba refletindo o nosso gosto pessoal e não deixa de ser uma espécie de “statement” sobre nossos valores. Você pode até achar fútil, mas não tem como negar: roupa, sapato, bolsa, joias, corte de cabelo etc. são signos de quem somos, a nossa tribo, nossos valores. Claro que é perigoso estereotipar. Só porque uma mulher anda com salto agulha e bolsa da Louis Vuitton, não significa que ela tenha o QI de uma lesma – ela pode ser uma pesquisadora reconhecida mundialmente! Da mesma forma, uma mulher que veste havaianas e shorts rasgado e sai de casa de cara lavada pode ser uma empresária famosa, dona de uma fortuna considerável. Mas, exceções à parte, nossos acessórios costumam comunicar algo para os outros. O carrrinho também não deixa de ter essa função. Há carrinhos modernos e chiques, descolados e differentes, com design escandinavo ou europeu, com aparência esportista ou mais tradicionais. Eu só acho importante embrar que o visual, necessariamente, vem em último lugar: antes de tudo, o carrinho é um acessório funcional. Portanto, não faça questão de comprar o carrinho das estrelas (para sua informação, é o Bugaboo Chameleon ou o Stokke Xplory) só para perceber que ele te dá a maior dor de cabeça no dia a dia!

Agora que compliquei um pouco a sua vida, lançando essas milhares de perguntas, vou descomplicar. Abaixo está uma lista de itens para você fazer uma tabela comparativa dos carrinhos que te interessam e que pode facilitar a sua decisão. Mais abaixo, dou dicas de recursos para ajudar na sua pesquisa e de marcas que eu acho legais, se você tiver o privilégio de poder comprar um carrinho no exterior.

Medidas (aberto e fechado)/ Peso / Preço / Assento reclina? / Assento reversível? / Nível de conforto/ Suspensão (repare nas rodas) /Bom de manobrar? /  Tipo de cobertura contra o sol/ Tamanho da cesta / Acessórios (adaptador para cadeirinha, capa de chuva, porta-bebida) /Visual

Dicas:

  • Entre em sites de grande tráfego, como a Amazon, para ler as resenhas dos carrinhos ou ver sua pontuação.
  • Assista a vídeos do carrinho em ação no YouTube ou em sites especializados, como a BabyGizmo.
  • Procure nas ruas da sua cidade os modelos que te agradam e, se tiver coragem, puxe papo com a dona e pergunta sobre os pontos fortes e fracos do modelo escolhido.

Marcas legais que talvez você não conheça: Baby Jogger, Bugaboo, Bumbleride, Phil & Teds, Quinny, UppaBaby & Valco.

Qualquer dúvida, entre em contato comigo. Como disse, ADORO falar sobre carrinhos de bebê e terei o maior prazer em te orientar, caso você ache necessário!

[Você poderá gostar também do post Como escolher uma cadeirinha para o carro/ bebê conforto?]

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Fraldas de pano modernas: amor à segunda vista

A primeira vez que soube de um bebê usando fralda de pano admito que achei um retrocesso. Pensei, na época, “por que cargas d’água uma mulher que trabalha e tem mil coisas a fazer optaria por um troço nada prático como a fralda de pano?” Eu morava nos EUA e estava na faculdade. A mãe da bebê era professora de letras, tinha doutorado, era inteligente e super ocupada (ah, e certamente não tinha empregada nem babá!). Mas eu a taxei de louca e eco-chata (dá um desconto – eu tinha 19 anos).

Anos mais tarde, quando comecei a pensar nas minhas próprias escolhas, descobri o universo das “cloth diapers” através de um anúncio online. E me apaixonei. Eram tantas opções bacanas, tantas estampas lindas, e aquilo me pareceu tão mais ecológico e tão simples de usar! Foi um caminho sem volta. Agora, tenho um total de três fraldinhas no meu enxoval e uma lista enorme* de marcas nacionais e importadas que pretendo comprar quando  estiver, de fato, esperando um pequenino serzinho cagão (foi mal, mas a fralda é pra isso, né?).

Queria poder dizer que essa escolha partiu de uma convicção ecológica, mas tenho que confessar que o primeiro impulso foi, como em muitos casos de paixão, estético. Eu achei as fraldas as coisas mais fofas e lindas do mundo. Tem fraldas de uma cor só, outras estampadas, umas felpudinhas, outras mais enxutas, orgânicas, de jeans, de lã… Cada uma mais fofa que a outra! Imaginei minha pequena/meu pequeno usando só aquela fraldinha linda no calor do verão carioca. Que amor!

Busquei me informar e fiquei sabendo das estatísticas sobre a quantidade de fraldas descartáveis que um bebê usa ao longo da vida (aprox. 6.000) e de quanto tempo a fralda leva para se decompor (mais de 400 anos). Li também que as fraldas descartáveis são o terceiro item mais encontrado em lixões e representam 30% de todo o lixo não-biodegradável. Ui. É um argumento e tanto.

Outro argumento a favor das fraldas de pano é a economia. Eu sou consumista, mas tenho um lado pão duro. E gastar dinheiro em fralda descartável, algo que vai direto pro lixo, não me anima. Veja a  matemática, considerando um custo mensal de 120 reais e o uso por dois anos:

Fraldas descartáveis: R$120 / mês x 24 meses = R$2.880,00

A conta para fraldas de pano não é tão simples, porque é um universo com milhares de opções, incluíndo fraldas pocket (com recheio), todo-em-um ou dois-em-um (capa com recheio), nacional ou importada, de algodão ou microfibra ou algodão orgânico, tamanho único ou P-M-G. Vou fazer as contas com as opções mais baratas e com as mais caras, usando como parâmetro 20 fraldas, o suficiente para quem pretende lavar dia sim, dia não.

Fraldas de pano tamanho único: R$40/ fralda x 20 fraldas = R$800,00

Fraldas de pano tamanho P-M-G: R$30/ fralda x (20 tamanho P + 20 tamanho M + 20 tamanho G) = R$1.800,00

Os céticos de plantão devem estar pensando “Ah, mas você não está incluindo o custo da lavagem das fraldas!” É verdade, não estou. Mas também não estou incluindo os custos com pomada (cujo uso não é recomendado nem costuma ser necessário para quem usa fraldas de pano), de gasolina para sair para comprar as fraldas todo mês, dos lenços umedecidos descartáveis (que também podem ser substituídos pelos laváveis) etc. E também não posso deixar de mencionar um outro fator econômico contundente: as fraldas de pano podem ser revendidas ou reaproveitadas para um próximo bebê.

O conforto para a pele do bebê foi o terceiro ponto que me fez vestir a camisa das fraldas de pano. Você já ficou assada usando absorvente “sempre seca”? Eu sempre fico e detesto. O bebê então, que fica 24 horas de fralda, 7 dias na semana… coitado do bumbum dele! É por isso que as pomadas são necessárias. A fralda de pano ajuda a evitar esse problema. Sem contar que são muito mais macias. E a maioria hoje em dia tem uma camada de microfibra que deixa o xixi passar e permanece seca, imitando o efeito “sempre seco” das descartáveis sem tantos produtos químicos que ressecam e podem fazer mal à pele sensível do bebê.

Apesar de todos esses fortes argumentos que apelam para nosso senso moral de responsabilidade com o meio ambiente, a preocupação com a economia e com o conforto e saúde do bebê, para mim, a decisão de ser uma mãe cujo bebê usa fraldas de pano, como disse anteriormente, foi muito mais fútil. Me apaixonei perdidamente – pelos modelos lindos, pelo universo das fraldas ecológicas e pela ideia de estar fazendo uma pequena contribuição para o meio ambiente. Quero abrir o armário e me deparar com as fraldinhas lindas – coloridas, estampadas, diferentes – que escolhi e lavei (uh… que a máquina lavou) como todo o carinho do mundo e ir dormir sabendo que os lixões estão com algumas fraldas sujas a menos por minha causa.

Será que estou viajando na maionese do idealismo? E vocês, exergam as fraldas de pano modernas como uma opção viável?

*A lista enorme inclui as seguintes marcas: bumGenius, Rumparooz, Fuzzibunz, GroVia, Muttaquin, Little Beetle (importadas) & Fralda Madrinha, Bebês ecológicos, What Mommy Needs e Efral (nacionais).

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Parto domiciliar: o que você deveria saber antes de julgar

O parto domiciliar está na mídia e na boca do povo. Infelizmente, tem muita gente escrevendo sobre o assunto sem o menor embasamento, sem ler um único estudo e sem a menor vontade de compreender o que leva uma mulher a fazer essa opção. Além das menções sensacionalistas e as descaradamente reacionárias, tem gente dizendo asneiras como “o parto em casa está na moda (por causa da Gisele Bündchen)”. Discordo: moda é quando algo está sendo adotado por uma maioria (neste sentido, moda é cesárea agendada). A realidade é muito menos interessante: o parto domiciliar é simplesmente uma opção – milenar, diga-se de passagem – abraçada por um grupo seleto de indivíduos, bem informados e conscientes, que compartilham de uma mesma filosofia.

A intenção deste post é explicar essa filosofia e defender a escolha consciente pelo parto em casa, entendido aqui como um parto conduzido em domicílio, natural (sem uso de drogas para acelerar o trabalho de parto ou anestésicos), na companhia de profissionais treinados (médico, enfermeira obstétrica, obstetriz ou parteira) em que mãe e bebê são considerados de baixo risco (estabelecido no pré-natal).

1. O parto é um evento fisiológico. Sei que isso é óbvio  – até mesmo os manuais de obstetrícia diriam o mesmo -, mas, na prática, a obstetrícia tradicional não respeita muito a fisiologia o parto e, geralmente, um parto hospitalar transforma-se num evento médico, uma oportunidade para submeter a paciente (sim, entrou no hospital e você vira uma doente, mesmo estando comprovadamente saudável o suficiente para gerar uma vida) a uma série de intervenções. Entre elas estão (basicamente em ordem) a tricotomia, a ocitocina sintética, a anestesia, a posição de litotomia, a episiotomia e a manobra de kristeller. Prometo escrever um futuro post sobre parto hospitalar tradicional para quem quer saber o que são essas coisas. No momento, o importante é dizer que o parto domiciliar, por acontecer no território da mulher e por ser acompanhado por profissionais que acreditam na fisiologia do parto, é livre de intervenções desnecessárias. A crença no parto como evento fisiológico se sustenta com base em estudos recentes sobre fisiologia do parto e também no senso comum: afinal, somos animais e não teríamos atingido uma população de 7 bilhões se o parto fosse um evento que necessitasse grandes intervenções médicas.

2. O parto domiciliar assistido e planejado é seguro. Embora a grande mídia ou o seu obstetra afirme o contrário, vários estudos comprovam a segurança do parto em casa. O mais notável é o estudo holandês – que traz dados de quase meio milhão de partos – e dois estudos recentes de 2005 e 2009 corroboram a conclusão de que o parto domiciliar é tão seguro quanto o parto hospitalar, para mães e bebês, e com menos intervenções (desagradáveis) para ambos. O único estudo relevante que traz dados pouco favoráveis ao parto domiciliar foi duramente criticado por publicações de peso como Nature e o The Lancet por causa da metodologia muito suspeita usada para medir a mortalidade perinatal (entre outros “detalhes” metodológicos, eles incluíram casos de partos extra-hospitalares não planejados, como nascimentos a caminho do hospital ou em casa desassistido). Mesmo assim, até esse estudo controverso confirma que, para a mulher, o parto domiciliar tem índices mais favoráveis (mortalidade, morbidade e intervenções) que o parto hospitalar. Vale a pena acrescentar que no parto domiciliar planejado sempre há um plano B e que, em caso da necessidade de transferir para um hospital, a equipe de assistência está preparada para essa eventualidade.

3. A visão tradicional e hegemônica sobre o parto não é necessariamente baseada em evidências científicas. Isso merece um outro post, mas o resumo é: várias práticas médicas vigentes são baseados não em dados científicos comprovando sua validade, mas em “achismo” ou “tradição” ou “ritual”. Isso ajuda a explicar por que os especialistas entrevistados pelos jornais e revistas (todos obstetras) são contra o parto domiciliar. A maioria não leu estudos sobre o assunto (só citam o estudo desfavorável, mencionado acima e ignoram dezenas de pesquisas mostrando o contrário). E pior: a esmagadora maioria dos médicos nem sabe o que é um parto 100% natural, protagonizado pela mulher e pelo bebê com toda a sabedoria milenar do corpo, dos hormônios e do instinto animal de parir. Os médicos treinados em obstetrícia aprendem na faculdade dois tipos de parto: cesárea e parto vaginal com intervenções de rotina. Basta ler um pouco sobre a história da obstetrícia para ver que o conhecimento médico é como grande parte do conhecimento humano: imperfeito, incompleto e totalmente ideológico. Infelizmente, essa ideologia hegemônica é compartilhada pela mídia e pelo povo como um todo. A sorte é que temos neurônios e estudos científicos como os citados anteriormente para pensarmos sobre essa ideologia com olhos críticos.

4. Parir na intimidade do lar permite uma experiência única e muito recompensadora. Veja qualquer vídeo ou leia qualquer relato de um parto realizado em casa e você vai começar a entender por que muitas mulheres alimentam o sonho de parir de forma natural, na presença de pessoas benquistas, num ambiente acolhedor e seguro e familiar,  onde vão se sentir livres para entrar nas posições e fazer os barulhos que bem entendem. Mais uma vez, isso está relacionado ao primeiro ponto (o parto como um evento fisiológico e, vou mais longe, um evento sexual). É impossível não se emocionar com a beleza e a magia de um parto totalmente natural. Por favor, entre AGORA no Google ou no YouTube e faça essa busca por relatos ou vídeos de partos em casa. Recomendo também o filme “Orgasmic Birth”.

Espero que eu tenha conseguido mostrar que o parto domiciliar é um entre as milhares de possíveis escolhas que estão abertas às gestantes de baixo risco. Outras escolhas incluem: parto normal hospitalar, cesárea intraparto, cesariana previamente agendada, parto natural hospitalar, parto normal induzido, parto domiciliar desassistido, parto natural em casa de parto… É uma lista bem extensa. Cada uma com suas vantagens e suas desvantagens. Num mundo ideal, qualquer escolha seria considerada válida contanto que fosse feita com base em informações de confiança, sem outros interesses que não a saúde da mãe e do filho e desejo da mulher. Esse mundo ideal, onde a inteligência e o protagonismo da mulher são respeitados, ainda não existe. Mas eu pretendo lutar por ele. E você?

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A mãezinha da capa vermelha: um conto de fadas

Era um vez uma futura mãezinha, linda e barriguda, levando em sua cestinha perguntas para a vovozinha. Sua avó era uma sábia anciã, que havia parido 10 filhos em casa, com parteira, e ajudara a trazer ao mundo seus 27 netos. A futura mãezinha estava grávida do primeiro bisneto da anciã e tinha certeza de que poderia contar com a sua avó para controlar seus medos e ansiedades.  Sabia que suas dúvidas seriam ouvidas com carinho e que poderia encher sua cestinha com dicas de como se preparar física e emocionalmente para o dia em que traria seu filho ao mundo. Mal sabia ela, a jovem mãezinha, que o lobo mau estava à espreita.

(c) Jessie Wilcox Smith

O lobo mau era o dono do pedaço. Dominava todos os bichos da floresta com sua astúcia e sua força. Gozava de muitos privilégios por ser o bicho mais poderoso da floresta. Mas a vovozinha era uma pedra em seu sapato; ela por si só até que era inofensiva, mas seu estilo de vida não era o que o lobo queria para sua floresta, que estava aos poucos ficando do jeito que gostava: ordenada, previsível, vigiada. No casebre da anciã, as flores cresciam sem a menor lógica, as ervas daninhas não eram extraídas com a devida diligência e o fogão ainda era a lenha. Tudo muito antigo e primitiva, segundo o lobo. A velha também não comparecia às reuniões promovidas por ele; às vezes, ignorava seus avisos, mostrando-se resistente ao novo visual, limpo, moderno e avançado, que ele queria dar à floresta. Estava na hora de ensinar a ela uma lição.

O lobo foi à casa dela e, sabendo da visita semanal da  sua neta grávida, aproveitou-se da ingenuidade da velha para lhe dar uma paulada na nuca, escondê-la no armário, e começar seu teatrinho. Sentiu um frio na barriga e uma descarga de adrenalina. A verdade é que o lobo gostava do poder, mas gostava também de se fantasiar – de ovelha ou de vovózinha, não importava. Vestiu as roupas da velha, colocou a touquinha na cabeça e tratou de relaxar seus músculos e suavizar o seu olhar para ficar com cara de bonzinho.

A mãezinha apareceu, ansiosa e sem fôlego, e foi logo ao assunto.

“Ai, vó, estou tão cansada! Essa barriga pesada, as pessoas toda hora me ligando, perguntando se já nasceu… Não aguento mais,” desabafou.

“Minha filha,” começou o lobo, em tom compassivo, “não se cobra tanto. Hoje em dia, ninguém precisa mais passar por isso. Por que você não marca logo a cesárea como fizeram suas amigas?”

“Mas, vó,” protestou a jovem, “até parece que a senhora não ouviu nada do que eu disse esses meses todos. Eu quero parto normal!”

“Sim, filhinha,” disse o lobo, alisando as orelhas. “Mas o neném já tá prontinho, o quartinho também, as roupinhas lavadas e passadas. O médico não disse que já podia nascer? Hoje em dia a cesárea é super segura, pra quê tentar o normal?”

“Vó, não estou te reconhecendo. A senhora não vê que isso é papo de médico, só por que é mais conveniente para eles? Eu sei dos benefícios do parto normal e prefiro esperar.”

O lobo esfregou os olhos. Tentou uma nova estratégia.

“Tudo bem, minha filha. Você pode tentar. Mas saiba que na nossa família, as mulheres têm a bacia muito estreita. E os bebês  hoje em dia são imensos. Na hora, não fique chateada se você não tiver passagem.”

Isso foi demais para a mãezinha da capa vermelha. Ela tinha lido os livros certos e frequentado grupos de apoio: sabia que isso não passava de uma tática para meter medo nas mulheres. Definitivamente, algo não cheirava bem.

“Não, não e não!” gritou ela, assustando o lobo. “Eu sei que todas as mulheres da família tiveram parto normal, caso contrário, não estaríamos aqui hoje. Sinto, do fundo do coração, que eu também serei capaz de parir. E vejo que você não é quem você diz.”

“Calma, mãezinha,” tentou o lobo. “Eu só quero o melhor para você. Posso te oferecer o melhor da tecnologia e da ciência. Um parto rápido, limpo, planejado e sem dor.”

Finalmente, o lobo mostrou as garras: era mesmo um lobo cesarista, como ela suspeitara.

“Dr. Lobo,” disse a futura mãe, em alto e bom tom. “Você me subestimou. Achou que eu era mais uma mãezinha mal informada e ingênua. Mas, dessa vez, doutor, quem se enganou foi você. Eu sou a mulher da capa vermelha, sou guerreira – luto para conseguir o que eu quero – e eu vou parir o meu filho.”

E com isso, abriu as portas do armário, segurou sua vózinha com firmeza e saiu da floresta do lobo.

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